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13 de Outubro de 2016 – 06h18 horas / Folha de S.Paulo

Juízes trabalhistas têm reagido a casos de litigância de má-fé condenando partes e advogados que mentem, retardam os processos e adotam práticas desleais.


O Tribunal Superior do Trabalho entende que não compete ao juiz condenar o advogado por litigância de má-fé na reclamação trabalhista.


Segundo o Estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o advogado pode ser responsabilizado solidariamente, mas isso deve ser apurado em ação própria.

 

Levantamento do jornal Folha de São Paulo mostra que alguns juízes punem os advogados, oficiam à OAB —para abertura de processo disciplinar— e nos casos mais graves enviam cópia da sentença ao Ministério Público e à Polícia Federal.

 

Não existem dados estatísticos sobre litigância de má-fé. A informação fica dentro do processo. A OAB não informa o número de representações que recebe e o número de punições aplicadas.


"Na Justiça do Trabalho, percebo que os juízes ainda são muito cautelosos no reconhecimento e aplicação das penas de litigância de má-fé", diz Fabíola Marques, advogada trabalhista e professora de Direito do Trabalho da PUC-São Paulo.


"A litigância de má-fé é uma prática muito comum e extremamente lastimável adotada por algumas partes e procuradores [advogados]", registra a desembargadora Águeda Maria L. Pereira, do Tribunal Regional do Trabalho de Santa Catarina.


A magistrada negou recurso de uma reclamante que pretendia transformar uma rescisão a pedido em dispensa sem justa causa.


Ela omitira haver trabalhado em outra firma após desligar-se da empresa. Para a juíza, o advogado e a autora da ação pretendiam levar o julgador a crer que a iniciativa da ruptura contratual não tinha sido dela.


Com base no artigo 299 do Código Penal (omitir declaração em documento público), condenou a autora e o advogado a multa e uma indenização provisória de R$ 15 mil.
Em Uberlândia (MG), um grupo de advogados ofereceu mais de 60 pedidos questionando a imparcialidade de um juiz trabalhista que os condenara por litigância de má-fé. Eles alegavam sofrer perseguição.


O juiz sustentou ter proferido inúmeras decisões favoráveis às partes defendidas pelos mesmos advogados. O TRT-MG multou os advogados por "forjar um estado de suspeição perene e generalizado do julgador".


Em Mauá (SP), ex-funcionário de uma indústria requereu o pagamento de horas extras. Numa audiência à qual o seu advogado não compareceu, ele admitiu que não fazia horas extras e que havia dito isso ao advogado.


A juíza Meire Iwai Sakata entendeu que não seria justo condená-lo por ato do advogado, pois o litigante "foi sincero no depoimento".


Em Diadema (SP), uma funcionária de um hipermercado alegou ter sido vítima de assédio moral. O juiz Diego Petacci julgou improcedente o pedido, pois "a única testemunha trazida foi alvo de tentativa de suborno para relatar a história".


O juiz multou a reclamante e determinou que fosse expedido ofício à OAB, à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal, para apurar eventual crime por parte da testemunha.


O juiz Marco Antônio Ribeiro Muniz Rodrigues, de Caxambu (MG), condenou um advogado por falsidade de assinatura numa procuração. A falsificação –confirmada por perícia técnica– foi mantida em recurso oferecido ao tribunal, que rejeitou o pedido.


Em Novo Hamburgo (RS), o juiz do Trabalho Thiago Boldt de Souza condenou um advogado a pagar multa e indenização por ajuizar ação sem anuência do empregado. Era prática recorrente desse advogado apresentar petições, com os mesmos pedidos genéricos, em diferentes reclamações.


AÇÃO DISCIPLINAR

 

"Toda vez que um juiz expede um ofício à OAB, é aberto um procedimento disciplinar", diz Fernando Calza de Salles Freire, presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP.

 

"Normalmente, a litigância de má-fé é imputada à parte. Se o juiz entende que houve conluio com o advogado, ele oficia à OAB. Mas são situações raras", explica. "A condenação ao advogado é discutível. Quem litiga é a parte,"


"Nós não temos estatística, o número é muito reduzido. Cada caso é um caso, e são sigilosos", afirma.


De acordo com Freire, apenas os advogados e as partes têm acesso ao procedimento disciplinar instaurado.


Se houver condenação, o caso passa a ser de conhecimento público, mas só no final do processo.


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