Fórum Jurídico, em Bauru, reuniu 500 pessoas para discutir o trabalho seguro no transporte rodoviário
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20 de Maio de 2014 – 01h20 horas / Ingrediente Comunicação

Durante dois dias, juristas, médicos, peritos judiciais, engenheiros e sindicalistas debateram caminhos para tornar o dia a dia do motorista mais seguro e com uma
jornada de trabalho mais justa.


Nos dias 14 e 15 de maio, Bauru foi sede do I Fórum Jurídico do Trabalho Seguro no Transporte Rodoviário, que teve como objetivo trazer ao debate público assuntos que envolvem as atuais condições de trabalho nos transportes, a resistência de setores da sociedade ao cumprimento da Lei nº 12.619/12 (conhecida como Lei dos Motoristas) e os prejuízos à sociedade decorrentes do adoecimento dos motoristas e dos acidentes causados pela inobservância da legislação.


O evento teve uma programação de uma conferência inicial e cinco painéis de discussão, que abordaram a saúde do motorista, um panorama dos acidentes no transporte rodoviário de cargas, os avanços da Lei 12.619/12, a submissão do motorista ao exame toxicológico, acidentes de trabalho e a organização sindical dos trabalhadores rurais de cana-de-açúcar.


Os painéis trouxeram informações e números que demonstram a dura realidade do motorista profissional. Segundo dados apresentados pelo Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Araraquara, José Antonio Ribeiro de Oliveira Silva, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) está muito preocupada e atenta às jornadas extenuantes. “Pesquisas apontam que a carga horária de trabalho de 11 horas, ao qual o motorista é submetido diariamente, é fator de risco de morte súbita por acidente vascular cerebral e infarto fulminante”, alerta.


O procurador do Trabalho, Rafael de Araújo Gomes, mostrou os prejuízos causados pela exigência das jornadas excessivas dos profissionais do setor. “Ao contrário do que se pensa, exigir que motoristas e caminhoneiros trabalhem por longas jornadas deixa o transporte mais caro. Do ponto de vista econômico empresarial é inviável exigir que estes profissionais percorram longas jornadas, isso gera prejuízos financeiros, além dos com a saúde destes profissionais”, comentou.


O assessor jurídico da FETCESP (Federação das Empresas de Transporte de Carga do Estado de São Paulo), Narciso Figueirôa Junior, esmiuçou diversos aspectos da Lei, apontando os principais desafios para que se cumpra o que é previsto na Norma.

“Temos alguns pontos que dificultam o cumprimento da Lei, como por exemplo, as ausências de pontos de parada para que os caminhoneiros e motoristas profissionais possam respeitar o tempo de descanso que é, segundo a Lei, de 11 horas”, destaca Figueirôa.
 

Narciso Figuerôa apresentou alguns números que demonstraram a precariedade das rodovias brasileiras. “Segundo dados da Confederação Nacional do Transporte de 2013, em 95 mil quilômetros de estradas pesquisadas no Brasil, 46% apresentaram problemas de pavimentação, 67% estavam mal sinalizadas, 77% tinham problemas de construção geométrica e 40% não tinha acostamento”, detalhou.
 

O procurador do Trabalho, Paulo Douglas Almeida de Moraes, disse que por ano, quatro mil motoristas morrem nas estradas, principalmente por causa do uso indiscriminado de substâncias lícitas e ilícitas. “Dados de 2012 apontam que 15% dos motoristas consumiram metanfetamina, 16% anfetamina, 46% cocaína e 15% usaram um coquetel destas três drogas.
 

Outra substância que apareceu na pesquisa foi o barbitúrico usado para conseguir dormir. A substância foi constatada em 8% dos entrevistados. Tudo isso mostra que o motorista consome, sim, drogas para trabalhar, inclusive para conseguir dormir, ou seja, eles perderam o controle do relógio biológico”, destaca.


A questão da submissão ao exame toxicológico foi abordada pelo médico-legista Arnaldo Tadeu Poço, membro do Cetran-SP (Conselho Estadual de Trânsito do Estado de São Paulo), que frisou os riscos do consumo de drogas ao qual os motoristas se submetem para conseguir atingir as metas impostas pelos empregadores. “Distúrbios de atenção e estresse estão entre as doenças que podem atingir estes profissionais”, apontou. De acordo com o médico, o uso de substâncias psicoativas é identificado em exames toxicológicos em um prazo de 90 dias.


A demora na regulamentação de uma legislação específica para o setor foi ressaltada pelo desembargador José Antonio Pancotti. “O transporte hidroviário, aéreo e o ferroviário tinham há muito tempo uma regulamentação específica. Apenas em 2012 conseguimos uma Norma para o transporte rodoviário. É uma conquista que demorou a acontecer e agora, a Câmara dos Deputados já aprovou um projeto que modifica para voltar à época passada. Isso representa um retrocesso na conquista”, diz, referindo-se ao projeto de ampliação da jornada, acrescentando às oito horas regulares, a possibilidade de mais quatro horas trabalho.

O perito judicial, Renato Orsi, comentou que a principal causa de acidente nas estradas são os maus hábitos ao volante, como o uso de eletrônicos, fumar cigarro ou conversar com o colega de cabine. “Esta falta de educação na direção já representa 76% dos acidentes”. O perito acrescentou ainda que a imprudência coloca o trânsito como a 3ª causa mortis no Brasil. “Nós temos no país uma morte para cada 690 veículos”, destacou Orsi. 


O descumprimento de algumas Normas foi apontado pelo procurador do Trabalho, Eliaquim Queiroz. “Em visita as usinas de cana-de-açúcar de Minas Gerais, encontramos um pentacaminhão com a placa traseira que apontava 30 metros de comprimento. Porém, além de ter cinco carretas acopladas, o que é proibido, o real comprimento do veículo passava dos 45 metros”, ressaltou.


As organizações sindicais também permearam as discussões do Fórum. O desembargador Lorival Ferreira Santos destacou que a falta de uma estruturação leva os motoristas à submissão das longas jornadas. “O trabalho extenuante é o fator determinante nos acidentes e na saúde dos profissionais. Os sindicatos devem debater isso com os motoristas, devem apresentar a Lei e mostrar os riscos de se expor a estas jornadas. É preciso ter o controle das jornadas”, comentou.


A desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani explicou o enquadramento sindical do motorista rural. “Sindicalmente, a atividade na direção do caminhão enquadra-se em uma categoria diferenciada de trabalhador, onde o setor precisa estar organizado profissionalmente para requerer os seus direitos”, disse.


O Fórum foi promovido pelo Ministério Público do Trabalho no interior de São Paulo, conjuntamente com o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, a Escola Judicial do TRT da 15ª Região, a Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado de São Paulo e o Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários de Lins e Região.


O evento teve o apoio do Ministério do Trabalho – Fundacentro, Nova Central Sindical de Trabalhadores, Força Sindical, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Terrestres, Federação das Empresas de Transportes de Cargas do Estado São Paulo e Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de Bauru e Região.


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