Compartilhe
30 de Janeiro de 2017 – 04h15 horas / Segs

Algumas reflexões importantes podem ser extraídas do encontro que reuniu especialistas de segurança pública, na terça-feira (24), no Rio de Janeiro, para discutir o avanço do roubo de cargas no estado, servindo de insights para a revisão da política de subscrição de riscos das seguradoras de transporte de mercadorias. No encontro do Fórum Permanente de Combate e Prevenção ao Roubo de Carga, realizado na Associação Comercial do Rio de Janeiro, ficou claro que, nos últimos anos, o roubo de cargas tornou-se o caminho para as quadrilhas de tráfico de drogas ampliarem seu poder econômico e bélico, ao usar também mercadorias roubadas como moeda de troca por armamento pesado.

 

Tal estratégia é ratificada por dados estatísticos: em 2013, foram 3.534 casos; passando para 5.590 no ano seguinte; alcançando 7.225 em 2015. No ano passado, as ocorrências somaram assombrosos 13.603 casos no acumulado até novembro, demonstrando que esta modalidade de crime está descontrolada no estado.

 

Participante do debate, o superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Rio de Janeiro, José Roberto de Lima, lembrou que as primeiras quadrilhas do tráfico de drogas a passarem a atuar no roubo de cargas foram as que controlam o tráfico nos Complexos do Chapadão e Pedreira, na Zona Norte da capital fluminense, tirando proveito de o fato desses comunidades ficarem próximas a vias expressas como a Avenida Brasil e a Rodovia Presidente Dutra, áreas onde também há galpões de empresas de logística- muitos abandonados. "A viabilidade econômica desse crime no horário diurno se tornou algo muito atrativo para o tráfico e isso está se espalhando. Quadrilhas de outras favelas estão aderindo", afirmou Lima, em sua palestra, sobretudo nos horários matinais, quando a rentabilidade do crime de roubo de carga supera a receita com o tráfico durante o dia, segundo o superintendente da PRF no Rio.

 

O delegado titular da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas (DRFC) da Polícia Civil, Maurício Mendonça, diz que o roubo de carga agrava a violência na cidade. "O tráfico está usando a mercadoria roubada para adquirir mais droga e mais armamento, fortalecendo o tráfico nas comunidades".
Ele lembra, porém, que este crime não seria tão estimulado se não houvesse uma rede de receptadores. "As facções conseguiram alianças com intermediários que alcançam receptadores. Eles são o maior problema do roubo de cargas, porque, se não houver receptador, não há roubo".

 

Os especialistas falam abertamente de comerciantes de estabelecimentos formais inescrupulosos, que dão a seus produtos a aparência de legalidade, sem que o consumidor desconfie estar adquirindo mercadoria roubada. Os alvos preferidos dos ladrões, segundo Mendonça, são produtos como carnes, bebidas e cigarros. "São produtos que podem ser vendidos de forma separada e fracionada. Isso dificulta a identificação da origem", afirma ele.

 

O presidente da Federação do Transporte de Cargas do Estado do Rio de Janeiro, Eduardo Rebuzzi, cobra punições mais duras para comerciantes que sejam descobertos como receptadores de carga roubada e lembra que muitos empresários de transporte começam a desistir de atuar na praça fluminense. "É importante que exista uma mudança na legislação para agravar penas: como cortar CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas) de empresas que sejam encontradas com produtos roubados ou cortar o alvará", sugeriu.

 

Segundo ele, "as empresas estão deixando de vir ao Rio de Janeiro”. “Tenho amigos empresários que falam que não colocam o pneu no Rio de Janeiro", diz Rebuzzi, que antecipa que o setor deve começar a implementar uma taxa emergencial de risco de 0,3% a 0,5% do valor das mercadorias que saem ou se destinam à cidade do Rio de Janeiro. O percentual, considerado uma defesa do setor, teria ainda R$ 10 a R$ 15 de valor mínimo de cobrança.

 

Para o superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Rio de Janeiro, existem ações de combate já adotadas para coibir a prática de roubo de carga nas áreas que foram mapeadas como mais críticas. O fundamental é que as autoridades sejam comunicadas rapidamente do ocorrido para dar resposta adequada, afirma.

 

Outras ações importantes incluem o arsenal tecnológico pelas empresas de transporte e mesmo um procedimento simples: a identificação dos veículos com a numeração das placas também na parte superior, para que possam ser mais facilmente reconhecíveis durante o monitoramento aéreo, sugeriu Rebuzzi.

 

Todo esforço é válido para combater quadrilhas cada vez mais preparadas para promover ataques e escoar com rapidez o produto roubado. "Não estamos falando de um indivíduo comum que está roubando apenas com uma arma. Estamos falando de organizações que se moldaram para aquilo".


voltar